sexta-feira, 10 de agosto de 2007

O esporte está doente

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Antonio Maria G.Lemos - Zurique 08/08/2007

Últimamente o que mais se lê são os escândalos consecutivos nas mais variadas modalidades esportivas. A sensação de que os nossos heróis já nascem dopados fica cada vez mais presente e claro. O que é pior, parece que a má vontade de mudar esse caminho iniciado e omitido há muitos anos atrás por todos nós cresce com o brotar dos escândalos. O que mais se vê são as diversas federações esportistas empurrarem a culpa para os clubes e pressão dos patrocionadores, enquanto que as classes juvenis continuam engatinhando debaixo dessas nuvens (ob)escuras.

Na verdade hoje em dia não se pode mais vibrar e torcer com toda a alegria e emoção, pois atrás da orelha algo coça e faz nos lembrar que talvez amanhã o recordista de hoje tenha que devolver a medalha dopada.

O último Tour da França - também conhecido como o Tour da Farça - mais uma vez de forma cruel mostrou aos seus fãs e adeptos o que todos nós fingiamos não saber.
Os nossos heróis já não são mais humanos? Não, eles são só um resumo do produto final gerido pela nossa sociedade de consumo e da pressão que nos obriga a conquistar sempre melhores desempenhos. (Sejam eles econômicos, esportistas, etc...) A pressão de se ser sempre e sempre melhor do que fomos ontem é tão grande, que humanamente, seja no sentido físico ou idôneo da palavra, deixou de ser possível de alcançar. Criou-se um problema, em que todos nós, somos ao mesmo tempo génio e a criatura monstruosa por nós criada.

O problema é que além dos conhecidos anabólicos que qualquer cidadão hoje pode comprar sem receita médica para aumentar a massa muscular nos seus treinos em clubes de "fitness" mundo afora, existem os métodos mais desenvolvidos, específicos, difíceis de comprovar e correntemente usados nos esporte dito profissional. Enquanto governos, federações, clubes, patrocionadores, redes de televisão, jornais e nós espectadores. não tivermos vontade ética e coragem para combater a "ilegal" legalização do consumo desses produtos. nada mudará.
Se levarmos em conta que no próximo ano as Olimpíadas serão na China, (mundialmente conhecida pela prática da corrupção no mercado financeiro e uso de "doping" nos esportes ), só nos resta esperar que a Confederação Mundial Olímpica seja consequente no controle, e faça dessa ocasião um marco que entre para a História do combate ao doping.
Por sorte, ultimamente alguns exemplos têem sido dados por algumas federações, canais de televião e governos, que nos mostram que nem tudo está perdido. Durante o último Tour da França os canais alemães ARD e ZDF que pagaram enormes somas para poderem transmitir ao vivo três horas diariamente, depois do primeiro escândalo e descoberta de uso de doping - neste caso foi descoberto o uso de transfusão de sangue enriquecido e oxigenado - assumiram a perda do dinheiro pago, mas em sinal de protesto negaram-se a transmitir A Farça, passando a só fazerem uma transmissão de um resumo de vinte minutos diários. Decisão correta que recebeu ainda mais respaldo com a descoberta de outros casos de doping nos dias que seguiram à decisão de cancelamento das suas transmissões. Neste mesmo Tour, devido à pressão feita pela mídia, pela primeira vez vários patrocionadores que não queriam ver o nome das suas marcas envolvidas nesses escândalos, cobraram a exclusão de suas equipes, fazendo que pelo menos três equipes abandonassem o Tour antes de chegarem a Paris.
Há que parabenizar os grupos ARD e ZDF, dois concorrentes na mídia alemã, que aproveitando o momento mais que oportuno (e na hora certa), se aliaram para declararem "guerra" aos organizadores, confederações e governos de grandes eventos esportivos. Conseguiram com que vários esportistas do passado e atuais voluntáriamente ganhassem voz ao reconhecerem em público que fizeram ou fazem uso de doping. Passando assim a denunciar várias pessoas poderosas do mundo esportivo europeu, que se não estão ou estavam diretamente envolvidas no aumento "a qualquer preço" do desempenho físico dos esportistas, pelo menos sabiam quais as federações, equipas ou esportistas que as praticavam ou fechavam os olhos. Ficou claro ao público que alguns esportistas do passado, hoje sofrem de doenças de rins, fígado e coração devido ao uso de químicas, que sendo elas quase sempre ilegais, fizeram deles quando jovens, verdadeiras „inocentes“ cobaias que hoje, no esquecimento das glórias passadas, estão pagando com as suas vidas.
Enfim, a boa notícia é que os escândalos já tomaram formato jurídico e vários processos com advogados de peso em vários frontes tiraram a vergonha das estradas e arenas, levando-as para o lugar certo de serem tratadas os temas ilegais, os Tribunais civis. (Pois os tribunais desportistas, não só nos países do Leste, estão totalmente corrompidos e sujos para com idoneidade esclarecerem a fundo as causas e culpados de tais práticas.)
Outra boa notícia movida pelo novo posicionamento de alguns grupos da mídia européia, que tiveram coragem de ir contra equipes ou esportistas e patrocionados – muitas vezes também grandes clientes da sues/TV, como Phonak, Telecom, etc - foi que os governos alemães e suíços de repente (!) liberaram verbas para os departamentos nacionais de controle e pesquisa anti-doping. Das boas notícias pode-se também contar que só o Comitê Olímpico Suíço investirá a partir de 2008 um milhão de francos suíços a mais, no controle intensivo de todos os seus desportistas olímpicos.
Além disso nos parlamentos suíço, austríaco e alemão, os políticos, (sedentos por uma nova causa derrepente popular), estão querendo criar leis que podem levar à exclusão perpétua de um esportista para sempre da federação nacional, o que segnificaria o fim da sua carreira. (Se ficar comprovado que em algum torneio representando a bandeira do seu país usarão doping.)
No caso dos esportistas que denunciarem que sofrem pressão de alguém, equipe ou patrocionador para fazerem uso de doping serão assistidos por advogados da federação competente contra os acusados/denunciados e recebem amnistia depois de um curto período punitivo de exlusão da Federeação a que pertencem.
Só punindo com consequência e rigor todos os envolvidos nessa maquiavélica máquina, é que se poderá incentivar os jovens à prática do esporte (profissional ou não).

Claro que há muitos interesses a ser defendidos com os mais claros e obscuros motivos. Alguns hipócritamente negarão até ao fim terem feito uso de doping, acreditando que a mentira deles, ficará eternamente sendo a verdade dos seus adeptos.
Haverá sempre os apologistas da legalização parcial de produtos que aumentem o desempenho físico para fazer "o circo" mais interessante. Acrescentando mais cínicamente que sem o uso de "certos métodos" os recordes do esporte como um todo, não serão mais praticáveis. Nesse ultimo grupo incluo o espanhol Dr.Fuentes que se gaba em suas palestras bem pagas, de não fazer nada ilegal, e sim fazer parte de uma minoria de bons médicos do meio esportista que sabem otimizar os rendimentos dos seus pupilos. (Na base das grandes empresas de auditoria; para cada $ investido, garantimos $$ de volta.) Onde preparadores físicos, patrocionadores e federações negam qualquer cumplicidade, mesmo havendo listas apanhadas nas rusgas policiais passadas, onde vários esportistas de peso mundial, aparacem como clientes.

Os Tours de ciclismo nos tempos do saudoso português Joaquim Agostinho tinham etapas muito mais longas que as de hoje e mesmo assim, com muito menos doping e pressão dos horàrios da TV e patrocionadores, as estradas do percurso estavam sempre lotadas de fãs que à beira do percurso ficavam esperando horas, até que os ciclistas num par de segundos passavam pedalando na sua frente.
Eram os tempos em que com duas câmaras de ar e uma corrente entrelaçadas no peito e na cintura, bomba de encher no aro, os ciclistas se levantavam às cinco da manhã (com chuva, sol ou neve), para duas horas depois já estarem pedalando os primeiros metros dos 400 Kms (!!) que iriam acabar de percorrer ao anoitecer. Os amigos ou companheiros de pedalação, sendo da mesma equipe ou não, se encontravam nos restaurantes simples de estrada para fazerem uma pausa, (afinal o corpo não é mesmo de ferro), comerem muitos carbo-hidratos, beber um copito de vinho tinto que também não caía mal, antes de voltarem a pedalar a sua própria corrida, seu objetivo pessoal.
Romantismo?! E isso não faz do esporte? Não seria a visão do verdadeiro sacrifício humano na busca do alcance dos seus próprios limites físicos e mentais, que nós procuramos ver nos nossos heróis?
Romantismo ou não, o que é certo é que não se pode querer negar verdade eternamente nem a índole do esporte em si, e assumir que muito antes dos dopados Carl Lewis (atletismo), Indurain (ciclismo), Barry Bonds (Baseball) e muitos outros esportistas, do futebol, remo, hóquei, natação, box, vôlei etc, o esporte já existia e fazia sucesso desde os mais remotos tempos da nossa civilização.
Só que ao contrário daquela época, hoje incentivar os nossos filhos a praticarem esporte, dizendo-lhes que esporte dá saúde e glória, soa extremamente cínico.
A inversão ou manipulação dos valores sociais, são o verdadeiro motivo do "anabolismo" da nossa sociedade, do qual o esporte é só uma ínfima parte dela. Ao nada se fazer contra o doping, os nossos heróis de hoje serão sempre rápidos ou temporários como uma chama de um palito de fósforo. Serão uns vaap-vuup, idênticos aos participantes de um prostituído "jet-set" formado no Big Brother Global, que amanhã ninguém mais se recordará de seus nomes. Os recordes se resumirão a um segundo de celebridade, comprovando o lado ridículo e hipócrita humano que nós ás vezes, ao negarmos o ter dentro de nós ou por ele sermos manipulados, jamais voltaremos a pisar o verdadeiro e limpo pedestal da História Esportista Humana.

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